Por Luke Coppen
O gabinete do Vaticano responsável pela doutrina respondeu às perguntas de um bispo sobre o papel das pessoas que se identificam como LGBT nos batismos e casamentos católicos.
O Dicastério para a Doutrina da Fé (DDF) publicou, a 8 de novembro, um documento de três páginas em italiano para responder a seis questões controversas.
O texto está assinado pelo Papa Francisco numa audiência do dia 31 de outubro, bem como pelo novo prefeito do DDF, o cardeal D. Víctor Manuel Fernández.
O DDF referiu ter recebido uma carta, datada de 14 de julho, do Bispo D. José Negri, do Brasil, com perguntas “sobre a possível participação nos sacramentos do batismo e do matrimónio por pessoas transexuais e homoafetivas”.
O Dicastério não apresentou uma definição para a expressão “pessoas homoafetivas”, parecendo usá-la para se referir a alguém que estabelece relacionamentos com pessoas do mesmo sexo.
O gabinete responsável pela doutrina afirmou que emitiu as suas respostas após o seu estudo e que, essencialmente, reafirmava posições que tinha expressado anteriormente, incluindo numa “nota confidencial” de 2018 em que abordava “algumas questões canónicas inerentes ao transexualismo”.
O DDF resumiu as perguntas do bispo da seguinte forma:
- Uma pessoa transsexual pode ser batizada?
- Uma pessoa transsexual pode ser padrinho ou madrinha no batismo?
- Uma pessoa transsexual pode ser testemunha em um casamento?
- Duas pessoas “homoafetivas” podem ser admitidas como pais de uma criança que deve ser batizada e que foi adotada ou obtida por outros métodos, como a barriga de aluguer?
- Uma pessoa “homoafetiva” e coabitante pode ser padrinho de uma pessoa batizada?
- Uma pessoa “homoafetiva” e coabitante pode ser testemunha de um casamento?
A resposta mais longa foi para a primeira pergunta.
O DDF afirmou que uma pessoa transexual que foi submetida a uma cirurgia pode receber o sacramento do batismo “nas mesmas condições que outros fiéis, se não houver situações em que haja risco de gerar escândalo público ou desorientação entre os fiéis”.
O documento acrescentou uma série detalhada de considerações destinadas a abordar os casos em que “há dúvidas sobre a situação moral objetiva em que uma pessoa se encontra, ou sobre sua disposição subjetiva para a graça”.
Acrescentou que crianças ou adolescentes com “problemas de natureza transgénera” também poderiam receber o batismo, se estiverem bem preparados e dispostos a ser batizados.
O próprio direito canónico não estabelece critérios específicos relativamente aos pais das crianças apresentadas para o batismo, estipulando apenas que o ministro do batismo deve ter uma “esperança fundada” de que uma criança batizada será criada como católica.
Respondendo à segunda pergunta, o DDF disse que adultos transexuais submetidos a cirurgia poderiam servir como padrinhos ou madrinhas “sob certas condições”.
“No entanto, como esta função não constitui um direito, a prudência pastoral exige que não seja permitida se houver risco de escândalo, legitimação indevida ou desorientação na esfera educativa da comunidade eclesial”, afirmou.
Por sua vez, o direito canónico estabelece que o padrinho de batismo deve ser um católico confirmado, que “leve uma vida consentânea com a fé e o múnus que vai desempenhar”.
Sobre a terceira questão, o gabinete de doutrina do Vaticano disse que não há proibição no direito canónico em relação a uma pessoa transgênero atuar como testemunha num casamento católico.
Passando à quarta questão, o DDF enfatizou que deve haver uma esperança bem fundamentada de que uma criança apresentada ao baptismo seja educada na fé católica.
A resposta não abordou especificamente as questões que pareciam ser colocadas, nomeadamente, se ambas as pessoas numa união homossexual deveriam ser consideradas como “pais”, ao avaliar as permissões necessárias para o batismo de uma criança e ao registar o baptismo nos registos paroquiais. — ambas as questões frequentemente discutidas entre os canonistas.
Em relação à quinta questão, o Dicastério observou que o direito canónico exige que os padrinhos batismais possuam aptidão para a função e levem “uma vida de fé de acordo com a função a ser desempenhada”.
Acrescentou que “quando a coabitação de duas pessoas homoafetivas consistir não em simples coabitação, mas em relação estável e declarada more uxorio [união sexual análoga à união estável], bem conhecida da comunidade”, a situação seria “diferente”. ”— manifestamente não é um indício de uma vida “de acordo com a função a ser assumida”.
“Em qualquer caso, a devida prudência pastoral exige que cada situação seja considerada com sabedoria, para salvaguardar o sacramento do batismo e sobretudo a sua receção, que é um bem precioso a ser protegido, pois é necessário para a salvação”, afirmou.
Prosseguiu: “Ao mesmo tempo, é necessário considerar o valor real que a comunidade eclesial atribui aos deveres dos padrinhos e madrinhas, ao papel que desempenham na comunidade e à consideração que demonstram pelo ensinamento da Igreja”.
“Finalmente, deve levar-se em conta também a possibilidade de que possa haver outra pessoa do círculo familiar para atuar como garante da correta transmissão da fé católica ao batizado, sabendo-se que se pode ainda assistir ao rito do batismo de uma pessoa não apenas como padrinho ou madrinha, mas também como testemunhas do ato batismal”.
Abordando a sexta e última questão, o DDF disse: “Não há nada na atual legislação canónica universal que proíba uma pessoa homoafetiva e coabitante de ser testemunha de um casamento”.
Fernández, que foi nomeado chefe doutrinário do Vaticano em julho e assumiu o cargo em setembro, prometeu trazer uma abordagem diferente para a função.
Numa entrevista ao jornal argentino Clarín, manifestou reservas a respeito de um documento de 2021 do DDF que afirmava que a Igreja não tem o poder para abençoar as uniões homossexuais. Referiu que muitas pessoas comentavam que isso “não cheira a Francisco”.
D. Negri é bispo de Santo Amaro, São Paulo. O bispo milanês, de 64 anos , é membro do Pontifício Instituto para as Missões Estrangeiras (PIME) e trabalha há décadas no Brasil.
Fonte: pillarcatholic.com, em 8 de novembro de 2023 (tradução nossa).